Orgulho!

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domingo, 8 de abril de 2012

TITANIC - IX PARTE

E cortava o coração essa queixa infantil na boca dum velho lobo do mar.
Puxou-se por ele para o mais alto da quilha; dois homens seguraram-no como puderam, e os vizinhos deram-lhe vigorosas fricções nas pernas para lhe restabelecer a circulação.
Procurávamos esforçá-lo quanto podíamos; senão quando passou uma nova onda, e logo depois vimo-lo a ele erguer-se, para em seguida descair e resvalar, morto, sem ter podido pronunciar outra palavra senão as que, algumas horas antes, ele mesmo fora o primeiro a rezar: Padre Nosso!

Ticket de embarque

A situação tornava-se de todo em todo desesperada. A frialdade vencia os mais resistentes: e eu, à minha conta, por mais que nadasse de rijo com as pernas, sentia o entorpecimento geral tomar-me gradualmente o peito.

Nem já avistávamos as luzinhas verdes dos escaleres, que se haviam afastado muito, nem o rápido luzir dos foguetes, certamente acabados.
Longo tempo havia que reinava silêncio absoluto, quando a voz dum companheiro me tirou do embrutecimento que me invadia:
"Já rompe a manhã!"
Era tempo que viesse qualquer coisa galvanizar-nos. Caso curioso: uma esperança nova entrou realmente a coar em nossas almas com a pálida claridade que ao lume da água avinha relfetir lá do horizonte, que em seguida avermelhou.

Comandante Edward J. Smith, sentado, o terceiro da esquerda para a direita
Nascido em Hanley, Reino Unido em 27 de janeiro de 1850, faleceu no naufrágio

Em clareando um pouco mais, enxergamos distante umas centenas de braças, ao este um grosso vulto negro que baloiçava ao som dos maares.
Chamâmo-lo.
Uma voz se pôs à fala. Era um moço do frigorífico, James Duvray. No momento derradeiro tinha conseguido com um de seus camaradas, lançar na água um armário de camarote, em ambos nesta instável jangada buscaram salvamento. Mas o companheiro morrera de frio, e Duvray dava-se por morto. Agora, valendo-se dos pés e das mãos como de remos, veio até junto de nós, e fomos de conserva derivando, ele de bruços no seu armário, que era sobrevarrido por cada onda um pouco forte, nós aferrados com as crispadas mãos à quilha do nosso barco.

Era dia claro.
Em torno, até onde chegavam os olhos longos, icebergues, pequenos e grandes, que ao sol nascente se tornavam rosados. Passando por eles, a brisa chegava a nós mortalmente fria. Quando a vista podia alcançar e distinguir, eram cadáveres e mais cadáveres. Lastimoso e horrendo espetáculo!
A vinte metros de nós, um grupo de oito ou nove corpos, homens e mulheres, todos suspensos por seus cintos de salvação, dançavam ao movimento das ondas. Esta vizinhança tétrica houvemos de aguentá-la mais duma hora. Ao depois, antes que fôssemos recolhidos, alongaram-se, sempre agrupados, sempre saltitando. A leste mormente, eram campos coalhados de corpos mortos, que nós, quando o escarcéu nos alteava bastante, divisávamos em postura vertical, assim sustidos pelos cintos de cortiça com a cabeça e os ombros fora da água.

O gigante jaz frágil no abismo oceânico

Parecia terem-se reunido propositadamente para morrer, e viam-se em mós apinhadas andar-se embalando, bem os bandos de ádens bravas nos grandes estuários.

Continua ...

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