Orgulho!

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terça-feira, 22 de março de 2011

RUMO À ESTAÇÃO BRASIL

EMIL TOMA A DECISÃO, ENFRENTA A BUROCRACIA E A VIAGEM


Imagem: cortesia Sérgio Lovatto
Documento: Reisepass (Passaporte)
Local de emissão: Oppenheim
Data: 3 de janeiro de 1924 (às vésperas do embarque)



Imagem: na lista de passageiros que saíram do porto de Hamburgo em direção ao mundo, consta o emigrante Emil Wichmann. O ano é 1924.

Obs: para acessar detalhes do embarque na internet é necessário o pagamento de uma taxa de 29,95 euros, isto é, quase R$ 100,00.


Antes de embarcar no navio, Emil atende a demanda de uma grande burocracia fazendo parte dela muitos carimbos do Consulado Brasileiro de Wiesbaden.

Enquanto Emil corre atrás da documentação durante o ano de 1923, na Alemanha os distúrbios do período do pós-guerra alcançaram seu ponto culminante (inflação, ocupação da região do rio Ruhr, intento de golpe de estado por Hitler, tentativas dos comunistas de tomar o poder). A seguir, com a recuperação econômica, estabeleceu-se uma certa calma política.

No Brasil, explode no Rio Grande do Sul a Revolução Gaúcha - o pica-pau Borges de Medeiros & o maragato Assis Brasil.
Quem governa nosso país é Artur Bernardes cujo tempo caracterizou-se por intensa agitação política e militar.

No ano que Emil chega ao Brasil, 1924, inicia-se a segunda grande revolta tenentista, a Revolução Paulista de 1924, considerado o mais sério dos levantes que acabou por levar à formação da Coluna Prestes.

Emil ficará na famosa Hospedaria Ilha das Flores no Rio de Janeiro, cujo carimbo acusa a data da sua chegada: 13 de março de 1924.


A PREPARAÇÃO

Quem pensava que o Brasil fosse a Meca da burocracia ...
Emil prepara sua viagem peregrinando pelo Consulado do Brasil em Wiesbaden e por departamentos que lhe dariam atestado de saúde, de trabalho (profissão), de bom comportamento, enfim, nada que desabonasse ou prejudicasse a vinda e a chegada do rapaz à terra depois do fim do Atlântico.



Imagem: cortesia Sérgio Lovatto
Documento: Ärzliches Attest, documento de saúde
Data e local: Oppenheim, 19 de dezembro de 1923.

Atenção! Repare nos três carimbos:
1º - Volksstaat Hessen (Estado de Hessen)
Kreisgesundheitsamt Oppenheim
(Departamento de Saúde local Oppenheim)

2º - Consulado Brasileiro de Wiesbaden

3º - Consulado de La Republica del Uruguay, Rio Grande, em 31 de março de 1924.




Imagem: cortesia Sérgio Lovatto
Documento: Certidão Profissional
Data: 4 de janeiro de 1924



Imagem: cortesia Sérgio Lovatto
Documento: Reisepass - Passaporte


* Na medida que o tempo permitir seguirei completando esta parte. Publicarei a foto de outra jóia da coroa: o embarque de Emil no porto de Hamburgo.

Pensamos muitas vezes que a grande maioria dos imigrantes eram camponeses ou operários. De fato, o raciocínio está correto. Porque pensando bem, se estou bem empregado no meu país, as crises não me perturbam, minha família vai bem, obrigada, por que tomaria a decisão de partir? Também não é tão simples assim. Muitos partiram devido a perseguições políticas, outros diante da guerra iminente, mais outros por aventura e havia aqueles que ganhavam um bom dinheiro coordenando o fluxo de saída/entrada dos países, conduzindo os migrantes para as respectivas colônias de povoamento.
Havia ainda os "Brummer", soldados alemães recém saídos de guerras no Norte da Europa e defensores de ideias liberais. Foram contratados pelo governo brasileiro em 1851, para combater Rosas, da Argentina. Na verdade, poucos lutaram na batalha de Monte Caseros, que derrotou o ditador. Passaram penúrias e desertaram segundo consta no livro "Imigração Alemã: 180 Anos - História e Cultura".

Emil foi o único da sua família que veio ao Brasil. Segundo seu neto, Sérgio, a família era numerosa, sem saber ao certo, falou em onze irmãos.

Em janeiro de 1924 Emil embarca no porto de Hamburgo



Reisepass (Passaporte)
Hamburg Hafen (Porto de Hamburgo)
Ausgereist an 21/02/1924 (Deixou o país em ...)



Imagem: cortesia Sérgio Lovatto
Embarque no porto de Hamburgo


Para onde olha Emil?
Para além do Atlântico?
No grupo predominam os homens (vinte e oito), há poucas mulheres (oito) e apenas seis crianças.
Parecem todos bem, alguns com um leve sorriso e muita roupa, afinal é inverno no hemisfério norte.


Hamburgo por ser cidade portuária foi presa preferida pelos ataques aliados. Ardeu em chamas até quase a sua destruição completa durante a Segunda Guerra Mundial.

No final da Idade Média, mais precisamente na Baixa Idade Média, Hamburgo fazia parte da Liga Hanseática juntamente com cidades famosas tais como Bremen e Lübeck. As hansas tinham o intuito de proteger comércio e comerciantes num tempo no qual estas atividades eram muito perigosas.

Hoje, Hamburgo totalmente reconstruída, é a segunda maior cidade da Alemanha e possui o principal porto do país. Está localizada no norte e é banhada pelo rio Elba.


De Hamburgo rumo à Estação Brasil. Ponto de desembarque: Ilha das Flores. Local para hospedagem: Hospedaria Ilha das Flores. Meio mundo teve neste lugar, parada obrigatória. Mas o que havia neste lugar de tão especial?


Imagem: Hospedaria Ilha das Flores, Rio de Janeiro


Imagem: Carimbo da Hospedaria de Imigrantes Ilha das Flores, Rio de Janeiro

Vou falar um pouco mais sobre esta famosa hospedaria amanhã.
Por enquanto, Emil ainda está em alto mar, fazendo planos e costurando sonhos.


A VIAGEM

Segundo o livro de Sílvio Rockenbach e Hilda Agnes Hübner Flores, "a travessia do Atlântico durava até três meses e era feita em navios à vela, frágeis "cascas de nozes" boiando na imensidão do oceano.

Josef Umann, que imigrou em 1877, relata a presença de animais vivos - algum gado, porcos e galinhas - para serem consumidos na viagem. Nas despensas das embarcações encontrava-se ainda verdura seca, pão, cachaça e algum vinho para os doentes. A água logo tornava-se imprópria para o consumo por causa do calor tropical.

Chegados ao Rio de Janeiro, submetiam-se à quarentena. Eram 40 dias de espera na Casa dos Imigrantes para as autoridades certificarem-se de que não traziam nenhuma doença contagiosa. Só então seguiam viagem".

Curiosamente meu avô. Karl Heinrich Gerhard Ruseler, que veio com dois irmãos ao Brasil por volta de 1889, não trouxe nenhuma doença contagiosa, porém a irmã, Rosa, acabou falecendo de malária no Rio de Janeiro, doença contraída após a chegada dela ao Brasil.

A CHEGADA

Emil chegou ao Brasil exatamente 100 anos depois da chegada da primeira leva de 39 imigrantes alemães a São Leopoldo, no dia 25 de julho de 1824. Esta data é considerada o marco inicial da colonização no Rio Grande do Sul.

Acredito que a viagem de Emil não deva ter sido tão rude quanto foram as viagens dos pioneiros do século passado. Ademais nem sempre o "pacote" oferecido na Alemanha pelos agentes do governo imperial correspondia ao mundo real deste lado do Atlântico. Alguns, chocados com a "rusticidade" do habitat, tomaram o rumo dum outro país, outros retornaram à pátria mátria.

A foto do grupo em Hamburgo nos mostra pessoas diria "não tão judiadas" como aquelas das primeiras levas da primeira metade do século XIX.

Existe uma boa discussão sobre a entrada de Emil Wichmann no Brasil. Como foi exatamente a sequência?
Rio de Janeiro - Rio Grande - "Mondevideo" (?) - Santa Cruz - Cachoeira do Sul.
Conversando com o Sérgio, ele me afirmou que Emil teria entrado pelo Uruguai. Porém, ando com a pulga ainda atrás da orelha: a autorização de imigração não foi concedida pelo Consulado do Uruguai em Rio Grande? Mas, é Rio Grande - Rio Grande do Sul, Brasil ou Rio Grande - Uruguai. Estou ainda tentando desenrolar este novelo de lã.

Quanto tempo Emil ficou na Hospedaria Ilha das Flores? Estou analisando e estudando as datas da documentação para tentar estabelecer o roteiro.

Emil está agora no Rio de Janeiro após menos de um mês de viagem. Menos de um mês?
No passaporte consta "Ausgereist an 21/02/1924", isto é, deixou o país em 21 de fevereiro. Teria a viagem durado menos de um mês? Parece que sim.
É março de 1924. Tem início o outono no Brasil. Será que no Rio fazia calorão naqueles dias?

Para onde foram aquelas pesadas roupas da foto de Hamburgo?


TEMPOS DE HOSPEDARIA
Na Ilha das Flores

Não sei se eram tempos de flores. O local constituiu-se numa hospedaria de imigrantes instituída por uma tal de "Inspetoria de Terras e Colonização" do Ministério da Agricultura em 10 de maio de 1883 (quase sessenta anos após a chegada dos pioneiros alemães a São Leopoldo). Localizava-se na baía de Guanabara e foi desativada em 1966.
Seus livros de registro estão guardados no Arquivo Nacional.

Dentro de seis anos, a partir da criação da hospedaria (1883), seria proclamada a República (1889).
D. Pedro II já enfrenta o desgaste da longevidade no cargo (serão longos 49 anos, isto é, de 1840 a 1889), dos novos tempos que exigiam mudanças e da política conservadora que mantinha o país nas mãos dos de sempre. O Brasil seguia agrário mas algumas pitadas de industrialização já davam o ar da sua graça. O gaúcho Barão de Mauá, um liberal e abolicionista mostrou que havia um outro mundo, que ficava além do pasto e da enxada. Os italianos, alguns deles anarquistas, outros com boas ideias de investir em indústrias reverteram o plano de colocá-los apenas nas plantações de café no lugar dos escravos, que por sua vez estão prestes a serem libertados (sem nenhuma indenização ou contra-partida do governo, diga-se de passagem).

A ideia da hospedaria era a de concentrar nela as centenas de estrangeiros de várias origens, estabelecer uma espécie de quarentena e posteriormente distribuí-los para as frentes de trabalho.
Emil permaneceu no Rio de Janeiro em torno de 15-16 dias. Levei em consideração que o deslocamento do Rio para para Rio Grande teria levado de 1 a 2 dias. Os imigrantes vieram para Santa Catarina e Rio Grande do Sul por navio. Mas então, no dia 31 de março seus documentos e passaporte receberiam o carimbo oficial do Consulado do Uruguai, oficializando a sua imigração. Por que o Consulado do Uruguai?
Estive hoje, 30 de março em três lugares oficiais e de pesquisa aqui em Porto Alegre mas ainda não obtive a resposta.
Em breve, Emil conhecerá sua companheira, Emilie Ruseler. O encontro acontecerá em Santa Cruz do Sul.
De Santa Cruz partirão para Cachoeira do Sul.

2 comentários:

  1. Boa tarde!
    Somos imigrantes russos que vieram ao Brasil na década de 50. Ficamos de quarentena na ilha das Flores e, em seguida, fomos enviados para Carapicuiba, em São Paulo. Estamos escrevendo um livro de memórias sobre os imigrantes russos desta época e gostaria de lhe pedir permissão para utilizar a foto da Hospedaria da Ilha das Flores, se possível, pois não temos nenhuma fotos desse local. Aguardo, ansiosamente, sua resposta. Gratíssima
    Ludmila Saharovsky

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  2. Prezada Ludmila! Sinta-se à vontade para capturar a foto de que necessita. Também estou escrevendo um livro sobre a saga da Família Ruseler, bisavós, avô e irmãos que vieram da Baixa Saxônia em 1888 e fixaram-se primeiramente em Blumenau e posteriormente em Massaranbuba, SC.Meu livro chama-se "Die Ruselers von Oberhausen (Spuren der Familie in Brasilien)" - Os Ruseler de Oberhausen (Traços da família no Brasil). Um dos primos da minha mãe porém, não por parte dos Ruseler (lado paterno) e sim pelo lado materno (Kroeger), casou-se com uma imigrante russa da comunidade menonita. Käthe nasceu em Omsk e vieram primeiro para o Paraguai (década de 1930). Mais adiante Käthe e seu esposo Erich Kroeger vieram a se estabelecer em Bagé, no Rio Grande do Sul. Sucesso no teu trabalho. Meu cunhado é um incorrigível apaixonado pela Rússia, já esteve três vezes por lá e acredite se puder, está aprendendo russo. Viajou até o Baikal e esteve também pela Mongólia.E eu também, gostaria muito de conhecer o Hermitage. Assisti há alguns dias um filme muito interessante - Arca Russa, recomendo. Grande abraço, Renate.

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